quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Agradecer ao Deus das pequenas coisas



Tão  bom e gostoso  podermos acordar por nós, sem barulho ou despertadores....sentirmos o nosso corpo regressar à vida.





Espreguiçar dentro da cama e em dia de frio e de inverno como agora, darmos-nos conta que estamos num quase ninho. 
O sítio da cama onde estamos,quente,doce e ameno,mas quando nos esticamos....encontramos o frio dos  lençóis  e  de uma cama  sem calor.  E queremos  de repente voltar ao ninho....mas esse vai sendo desfeito  com o despertar do nosso corpo.   
Foi como se estivessemos a  despertar  de  um  pequeno  período  de  hibernação, onde nos mantemos quentes, respiramos fragilmente e estamos fora do nosso quotidiano. 
Pairando num limbo entre sonho e realidade, a cama quente onde nos aninhamos....

E mesmo dando na parte fria da cama, esticamos-nos várias vezes, com os barulhinhos que nos saem  espontâneamente  da  garganta.

(Dizem que nos devemos esticar várias vezes ao dia. Esticar o esqueleto  e os músculos,   atrasa o envelhecimento das articulações e dos ossos, dos tendões e músculos....e nós queremos é  ser jovens...)

Depois é quase um ritual, sair do ninho,  esvaziar de fluídos orgânicos....abrir a  janela do quarto e ver  o tempo lá fora, registar para o nosso álbum fotográfico anual,  com o que estiver à mão, câmara ou telemóvel...
Até isso mudou...antigamente era num diário ou num caderno, onde cada dia tinha título, "sol, sem nuvens, azul de morrer", ou " nevoeiro, capacete...brisa marítima" ou ainda "chove a cântaros" ou "chove a pique, não se vê nada"...hoje fazem-se fotos porque o telemóvel é parte de nós...será?

Depois é o velho ritual, lavar dentes, beber um ou dois  copos  com  água. 
Estar meia hora apenas com  água no organismo. Dizem que purifica...acreditamos em tudo quando não queremos morrer, nem ficar doentes, queremos perpetuar o mais possível a juventude que se esvai a cada dia que passa!...

Dar comida aos peixes do aquário,   abrir todas as persianas da casa e espreitar lá fora.  
Dar  papa aos miaus que  andam atrás das nossas pernas reclamando a primeira refeição,  que já vem tarde. 

Colocar a chaleira  com água e ligar à tomada para daí a meia hora fazer o aromático café matinal, o que nos desperta os neurónios para a a vida.
Deixei de fazer à máquina, à turca ou no passador de papel, é tão melhor...tão mais espumado e aromático. 
Odeio máquinas de cápsulas. Sabem-me os cafés todos a plástico quente...talvez porque tenho um paladar muito apurado, sei lá.


Darmos-nos conta do prazer que temos nestas pequenas coisas, prazeres  recentes que só conhecemos quando estamos   quase a entrar na meia idade...noutros tempos,  não havia tempo para  um por cento do ritual de hoje, nem mesmo aos finais de semana...com filhos pequenos, é para esquecer!...

Mas afinal que nos resta, depois de trabalhar tantos anos, de criar filhos e  de ter tido tanta responsabilidade, tanta chatice, (que a bem dizer continua a existir, só que nos borrifamos mais para ela), se não usufruir  deste bem, destes momentos ?? !!
Resta-nos então agradecer ao Deus das pequenas coisas, por este pequeno ritual.
E agradecer, acima de tudo, o termos acordado, esticado e voltado a abrir os olhos, para olhar o azul do céu e as belas ondas do mar, o verde dos campos, cheirar as coisas que amamos, e sentir...estou vivo, mais um dia que ganhei! 


Ai o Natal....


Este ano o meu Natal  foi ainda  menos convencional do que os anteriores.  Raramente faço pratos tradicionais. Odeio fazer o que todos os outros  fazem, até porque peru e bacalhau, como todo o ano e o que interessa é mesmo estar em paz, mesmo que sozinha. 
Nos últimos anos tenho passado o Natal a dois, e este ano, ainda não foi excepção.

Para ser sincera detesto tudo o que seja comercial, fácil, oco, bonitinho de aparência, pessoas falsas ou pretensamente cultas, mas que têm  sentimentos contrários aos meus.
Norteio a minha vida por princípios. Nem sempre entendidos até pelos filhos, quanto mais por quem não me conhece de parte nenhuma.
A única coisa que quero mesmo, para mim e para o meu companheiro de vida, é paz e serenidade. Que as quezílias fiquem fora da redoma neste período.  Não quero nem aproximação de quem me quer mal, me faz mal, me inveja,  me olha de esguelha, me contradiz, me critica mesmo que nas costas e em surdina. Esses não são meus amigos e eu não os quero a ver-me, olhar-me, ler-me, partilhar o que gosto.

Como não praticante de nenhum credo para além de amante da natureza, sinto recentemente um certo apego a Francisco, o novo Papa. Quero acreditar que o Universo congeminou na vinda dele, na sua eleição, para trazer mais realeza ao mundo. Porque a felicidade não é dos ricos. 
Conheço tanto rico pobre de amor....que apenas tem dinheiro, e esse deve ser o estado mais pobre e triste que algum ser humano pode experimentar.

Este Natal foi para mim mais um período onde alegria,  houve pouca. 

Não são só os problemas de cada um, mas por todo o mundo houve problemas. 
Mortes nas cheias no Brasil, mortes e milhares de pessoas afectadas pelos temporais na Inglaterra, Irlanda e Escócia, no Canadá, mais de meio milhão de pessoas sem electricidade, outras sem poderem viajar, milhões com fome, chuvas torrenciais, e a constatação de que o mundo é cada dia mais desigual. 
A Terra,  o verdadeiro paraíso que muitos homens  tornam   no maior dos infernos!

Portugal empobreceu, mas subiram o número de milionários....fantástico não é?
 
É nestes dias que pensamos em todas as guerras, especialmente na Síria, aos problemas de Gaza e todo o médio oriente, o drama do tráfico de seres humanos, ainda o Iraque, nos países do Corno de África, na corrupção de políticos que vai da esquerda à direita....um horror... este mundo!

Por isso pergunto, porquê comemorar o Natal da maneira como hoje é feito? Sem o espírito. Nasci uns bons anos depois da II Grande  Guerra, mas era criança e ainda recordo as filas de pessoas com senhas para o pão, para os lacticínios. Nesse tempo, posso garantir-vos,  em casa de meus avós paternos  vivi os únicos natais da minha vida, a sério. Não havia prendas...quantas vezes se recebia uma camisola tricotada à socapa por uma tia, ou umas meias, nos  longínquos anos cinquenta, era um luxo ter certas coisas. Porque a guerra devastara parte do mundo, havia pouco que comer e comia-se das hortas, o resto trocava-se. Recordo dos meus vestidos, até ter uns sete anos, creio que eram feitos de camisas de meu pai e tios, que começavam aqui e ali a ficar puídas, Tudo se aproveitava. Bons tempos esses, muito mais tarde tive uma boneca de papelão que veio de Espanha...de onde não vêm nem bons ventos nem bons casamentos, eu tive a minha boneca. E caramelos...meu avô materno lá arranjava quem lhe "passasse" uns pacotes de caramelos. Contrabando, na altura. Vivíamos uma ditadura de direita!!

Hoje os filhos, na maioria das vezes não querem estar com os pais, preocupam-se que "prenda"  vão receber,  por isso e de há uns três anos a esta data, cá em casa, há pequenas recordações, um livro, uma caixa de bombons, uma vela, uma planta e pouco mais. 
Porque o Natal se não é para ser vivido em família, não pode ser desculpa para endividamento, para dar cabo do fundo maneio da família.
Porque o Natal é confraternização e é essencialmente uma boa época para fazermos um exame interior, de renascimento dentro de nós mesmos, sem medos e retirar de nossas vidas o que nos faz mal, sermos capazes de cortar o tal cordão que nos prende ao sofrimento. Sermos capazes de fazermos projectos, o tal dos pequenos passos, mudando o nosso interior,  a pouco e pouco, para melhor, sempre em frente e sem olhar para os erros do passado, sempre na senda da paz e do renascimento do nosso eu. 
Para mim é isso o Natal,  geralmente período em que passo largas horas sozinha na cozinha, fazendo coisas que todos gostam e com muito amor, mas que serve essencialmente como uma purga interior. 
É nesse  período que eu sei,  tenho Deus em mim, porque eu saio iluminada desses períodos e com motivos e forças para continuar, mesmo sofrendo, mesmo não tendo o sucesso que sei merecer, mas reforçada na minha alma e com muito mais ânimo. É por isso que amo o Natal. 
Saio sempre mais forte e convicta de que o caminho é para continuar e percorrê-lo sempre com mais propósito e ânimo.


Por isso vos desejo também, Feliz Natal!